Pular para o conteúdo principal

Egoísmo, individualismo e tecnologia

Ao usar fones de ouvido, portas trancadas e grosserias desnecessárias cria-se um quadro de isolamento. Não pense apenas em adolescentes. Relembre a quantidade de vezes que os vidros dos carros estão fechados, com a desculpa do calor ou da chuva, mesmo em um dia com temperaturas amenas. Até que ponto o individualismo não se torna egoísmo?
Vive-se na era da conexão: todos conectados com o mundo. A garçonete australiana sabe a cor preferida do homem ferido por um touro na festa de São Firmino, e o vestibulando de engenharia já sabe todo o mapa astral da morena do segundo ano da faculdade de medicina que é prima do irmão do melhor amigo dele. Mas você mal sabe o nome do seu vizinho, e sua mãe não faz ideia da sua nota alta em álgebra. Seu pai descobriu que você ''está em um relacionamento sério" porque atualizou o Facebook. Qual foi a última vez em que os integrantes de sua família almoçaram juntos?
Em toda a história humana, com destaque para o atual período capitalista, o uso do pronome possessivo "meu", tanto no feminino quanto no masculino, diga-se de passagem, é comum. Até mesmo entre os noivos mais apaixonados. Existe uma considerável diferença entre o uso desse recurso semântico de posse: minha calcinha; minha jaqueta. Quando se vive em conjunto, sendo ele conjugal, familiar, ou apenas entre indivíduos com interesses comuns, costuma-se misturar individualismo e egoísmo. Todos somos seres individuais, porém, sociáveis; entendendo-se que a partir do momento em que um indivíduo se encontra em uma sociedade, é papel crucial do mesmo pensar como um todo - o que entra em conflito com a definição de todo. Não se pode pensar em publicar um status de vida numa "rede social" enquanto os seus parentes mais próximos não sabem dos seus sentimentos; sejam eles os mais superficiais possíveis. 
O mundo não gira em torno da convivência virtual; enquanto seus olhos estão pregados nas fotos do Instagram, e seus ouvidos recebem as vibrações sonoras do seu playlist no Plaay, o verdadeiro mundo, o mundo real, está acontecendo à sua volta. 
Em geral, do ponto de vista de um participante da Geração Y, excluídos são aqueles que não estão conectados com a constante massa de informações que são jogadas a cada minuto na internet. Mas a "rede social" mundial é mais do que uma simples citação de um livro de Osho; o qual nem foi lido por aquele indivíduo que postou; a "rede social" mundial, vai além de #partiu #academia. É preciso saber distinguir onde seu espaço como ser participante de um todo começa, e onde ele transborda, tornando-o assim, um participante inativo do meio em que vive.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Voo 3087

Finalmente usei minha mochila nova. Eu estava a ponto de ir na padaria comprar pão só para poder usá-la. Mas não fui à padaria, fui ao aeroporto. Antes de entrar no saguão de embarque tive que passar pelo raio x e abandonar minha mochila. Mas não estou aqui para falar dela, mas de uma senhora bastante comum. Entrei no avião e procurei minha poltrona rezando para que não ficasse espremida entre dois lutadores de MMA. Por sorte, sentei entre uma senhora e um senhor. Inicialmente,  pensei estar separando um casal, mas depois percebi que não estavam juntos. Pois bem, a senhora, que estava na poltrona da janela, tinha um ar de vó. Isso mesmo, um ar de vó. Antes da decolagem, pegou seu terço cor de rosa e começou a rezar baixinho. Não vou negar: achei que fosse daquelas católicas chatas que reclamariam da minha calça de fundo baixo e rasgada. O avião se estabilizou no ar, e a senhora do meu lado esquerdo me perguntou se teria algum jeito de usar o celular para ficar jogando. Isso mesmo,

Impunidade

Desperdiçam-se vidas. A morte é tolerada como mais um detalhe na grande malha colorida do carnaval. Na festa que tudo permite, as perdas são banalizadas, e os ganhos são contabilizados por beijos ou transas. A saúde se fantasia com preservativos; fronteiras entre a brincadeira e a seriedade são violadas, gerando a fragmentação dos valores éticos e sociais. Após quatorze anos de espera por um rim, uma mãe de família é privada de recebê-lo. E a causa não é a falta do órgão, mas de médicos dispostos a perderem um desfile das escolas de samba em troca de uma vida. Chamem os justiceiros. A moral foi mais uma vez corrompida. Todavia, os malfeitores não são ladrões de sucos ou de carteiras, são frequentadores de universidades, componentes da alta classe da sociedade brasileira. Os cidadãos se dizem cansados com a falta de respeito do governo. Na tentativa de curar um câncer político, mutilam órgãos e células que não passam de vítimas da doença há muito impregnada no corpo social. Os cér

Os males existem para algum bem

Nada é, inteiramente, ruim: em um mesmo caso dois lados podem ser observados. Muitas vezes, porém, a maldade é mantida como versão exclusiva. Dessa forma, acontecimentos são julgados pelos seus desdobramentos, e não pelas suas causas. Assim, a focalização das tragédias é feita na essência: o drama. Quantas vezes sabe-se de uma enchente que prejudicou o abastecimento elétrico de uma região e o primeiro pensamento foi acerca das perdas decorrentes disso? Ou algo mais devastador: quantas vezes se observa um atentado terrorista e julga-se, instantaneamente, como um ato incomparavelmente absurdo? Todavia, deve existir outro modo de pensar. As empresas especializadas no aluguel de geradores claramente se beneficiaram com a situação; do mesmo modo que fundamentalistas comemoraram por terem defendido o nome e a imagem de seu Profeta. É sabido que nenhum ato mortal é justificável. Com base nisso, pode-se dizer que alguns limites são necessários e a tolerância deve ser fundamental. Dessa fo