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Cruzamentos



Nos encontramos por acaso. Um caso de meia tarde. Eu atravessei a rua, você dobrou a esquina. Nos falamos porque você era alto e eu usava tênis. Descobri que as pastilhas laranja costumam ser azedas. Você, com um jeito meio distraído, quase é atropelado quando atravessamos a outra rua. O cara da banca de revistas gritou “cuidado!”, mas não foi pra você.
Você é do tipo de pessoa que anda quarteirões da sua casa até a casa do vizinho mais longe só pra jogar bola na frente do portão dos outros. Você não é daqui, por isso o cara da banca de revistas não gritou pra você. Talvez tenha até gritado, mas só porque você parecia ser um comprador em potencial. Atravessamos outra rua. Sorte a nossa estarmos indo na mesma direção.
Te mostrei um texto meu. Você disse que era tão complicado quanto entender como é gostoso pão de queijo com chocolate quente. Ainda bem que você acha essa mistura gostosa. Descobri que as pastilhas vermelhas costumam ser enjoativas e que você gosta de dizer que uma frase não pode começar com preposição. Eu disse que tinha licença poética e você aceitou a desculpa tão bem como aceitou que eu não gosto de suco de morango. Você aprendeu a gostar das ruas. Eu aprendi a gostar das esquinas.

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